"O velho Leon Tolstói fugiu de casa aos oitenta anos
E foi morrer na gare de Astapovo!"
(Mário Quintana)
I
fugir é improvável,
a mulher os filhos o reboco esburacado, uma parede não erguida
rachaduras
tudo lhe pesava
sentou apenas ao lado das lembranças
daquele velho banco
caramujo em silêncio de planta
em solidão de jardim extinto
sentou naquele banco daquela última estação de trens fantasmas
sentou-se e não havia poesia
nem romance, nem Tolstói nem Quintana
viriam socorrê-lo
agora apenas a brutalidade de um sol breve,
de uma brisa maternalmente distante
uma última lembrança sobreveio: a concha pesou demais: deixou-se ficar até ver detrás da janela o último trem finalmente partir da velha estação
onde peanecera sentado sem nenhum espanto
II
Tolstói não imaginava que um dia Quintana faria um poema sobre a capacidade de se morrer tão pateticamente
Já Quintana deve ter pensado: que há de mais patético que ser poeta?
mãos à obra:
o que tinha sido mero banco, uma estaçãozinha de nome esquisito,
a ficção de uma vida inteira
envelheceram cem anos
da sua morte como matéria bruta
à transformação em álcool,
da inércia etílica, à embriaguez
e finalmente à náusea seguinte
(ou mesmo até o segundo engov)
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